quarta-feira, 6 de dezembro de 2017
Crônica.V.001 - Virar a mesa - Sonia Blota Belotti
Eu não sei se há anos atrás era mais natural falar sobre isso, se era mais fácil saber o que fazer com a situação, o fato é que parecia mais tranqüilo ouvir sobre a passagem da vida adulta para a velhice. Conheço mulheres hoje que batem na madeira, se protegendo só de ouvir a palavra! Velhice hoje é quase um palavrão. Tem até apelidos: maturidade, maioridade, terceira idade, melhoridade... Há um pré-conceito que define o velho como aquele estado que ninguém pode se deixar chegar, o trágico final, o resultado de alguém que desistiu, não se alimentou com vitaminas mágicas, não fez ginástica suficiente contra a flacidez, não fez aplicações, plásticas e preenchimentos! Todo mundo fica velho. (se não morrer antes, o que é pior...) A velhice é uma passagem que mesmo que não se queira comprar, chega em nossas mãos. Não adianta ficar na estação, olhando pra cima e assobiando, fingindo que pode embarcar no próximo trem porque aparenta ter 10 anos a menos que sua idade. Você já viu um teste que separa a idade cronológica da idade biológica? Eu gostaria de ver as pessoas querendo saber se tem idade psicológica saudável, porque nessa, quanto mais velha, melhor! Nada contra se cuidar, sou totalmente a favor de nos gostarmos, nos honrarmos cada vez mais! Mas se cuidar para estar neste embarque para a etapa final da vida da melhor forma possível e não por medo de entrar. Cuidar da mente e do espírito também: ampliar horizontes, arejar as idéias, aprender mais, lembrar de rir (e muito), brincar, ousar e, principalmente, se conhecer profundamente para poder compartilhar sabedoria e experiência com as pessoas ao redor!
Jung falava de um modo lírico sobre este momento em que subitamente percebemos a passagem do Tempo. Tomamos consciência que estamos na metade da vida, como se ouvíssemos badaladas do meio-dia no nosso tempo interno. Sabemos neste instante que a manhã do nosso existir já se foi, com a ingenuidade e o frescor que a manhã sempre traz. Irreversivelmente. O vigor e a potência estão em nós como o sol forte desta hora. Dali para frente teremos a tarde da nossa existência: mais tranqüila, menos ansiosa, mas não menos bela - só é diferente da manhã. E depois de uns anos a noite: misteriosa, profunda e transformadora. Até este momento da vida usamos a energia para subir a montanha, conquistar nosso lugar no mundo, fazer vínculos, constituir família. A partir dele começamos a descer a montanha, pois o por deste sol será visto com tranqüilidade lá embaixo. A descida não é pior que a subida, só é diferente. A energia não é a mesma: não se precisa mais de tanto ardor, tanto custo para se conseguir as coisas; há uma nova sabedoria no seu uso.
Imagine quanto desperdício de energia há em alguém que tenta se manter em cima do cume da montanha, quando todo o objetivo naquele momento é de começar a descer. Você já viu alguém tentando subir uma escada rolante que desce? Não seria melhor aprender com que forças a descida é mais rica? Não seria melhor olhar e perceber que um novo ciclo se inicia e que se deixar contagiar por este ritmo novo é a maior prova que você é uma pessoa adulta, amadurecida? E então, você vai ser daquelas que fica esperneando na estação, reclamando de uma viagem que ainda nem começou? Que tal ter a coragem de embarcar com um sorriso e maravilhar-se com a paisagem do entardecer?
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