quarta-feira, 28 de janeiro de 2015
Crônica - D.002 - D'arte, Paixão e Poesia - Ângelo Rodrigues
Num dos primeiros escritos da sua juventude (1796/1797), Hegel afirmou que «(...) já não haverá nenhuma filosofia, nenhuma história, apenas a arte poética sobreviverá a todas as restantes ciências e artes». Apesar do risco da afirmação, no contexto e no âmbito da distância temporal, esta intuição profética do jovem Hegel, não é ainda realizável, não está em consonância com estes nossos tempos de perplexidades, confusão geral, falta de sentido e “algum” vazio espiritual; contudo, há algumas boas pistas, determinados trilhos que nos permitem afirmar que a reconciliação do homem e do universo pela criatividade e pelo artístico, está sendo preparada e que as próximas gerações irão assistir a um regresso - desejado e necessário - à Arte por excelência (uma espécie de deificação do Homem). Deixemo-nos de artimanhas progressistas e de fixações cibernéticas, tecnológicas e afins; a humanidade, em toda a sua essência, plenitude e dignidade, só continuará sendo possível pela Arte.
As “aventuras” criativas (uma aventura é inicialmente uma surpresa e depois uma memória) serão património mítico/cultural e farão parte do imaginário de um povo intelectualmente ousado, se forem dignamente vividas. Viver-em-Arte (criando, fruindo e partilhando Arte) é fundir-se no Todo-Absoluto, é fazer pontes com os materiais estéticos da alma, reconciliando o apolíneo e o dionisíaco da Vida. Toda a Arte liberta e aproxima do essencial... A Eternidade não é, decerto, uma doença das ideias, ela revela-se na Arte verdadeira - a Arte despretensiosa, autêntica porque espontânea mas insatisfeita, sentida e amadurecida; dela brotará “infalivelmente” uma significativa revolução cultural e espiritual. O efémero, o passageiro, o banal, é próprio da radicalização dos opostos, é peculiar dos que desistem de aprofundar e descobrir poeticamente os pequenos-grandes enigmas da sua criatividade, muitas vezes adormecida pelo embalar conceptual e conservador das ideias feitas, fáceis e indiferenciadas. (...)
(...) A insatisfação-permanente deve ser o critério máximo. Rasgar deve ser o gesto mais natural de um escritor, de um poeta. Contudo, escrevam... O que está dito e “registado” ficará sempre aquém do muito que falta por dizer. Temos todos a responsabilidade quotidiana de des-construir para construir a Vida - esse mistério tão rico de contradições e tão salutar de diferenças. Nem que seja apenas uma intenção, um sentimento, uma palavra ou um poema que se destaque (...) - valerá sempre a pena Dizer ao mesmo tempo que se procura coerência, sentido e autenticidade - alguém, poderá fazer disso que se diz e vive, a motivação e o ânimo para uma reveladora e interessante caminhada espiritual. «O caminho faz-se caminhando» e o escritor, o poeta, faz-se escrevendo, sentindo, amando, conquistando o Impossível a fim da máxima espiritualidade. Se chegares ao fim de uma caminhada, à beira de um abismo ou às proximidades de uma barreira, não fiques lá apenas a contemplar as aporias do mundo e a olhar os trilhos já por outros construídos e palmilhados - não deixes de usar o sonho, a vontade e a imaginação e continua a caminhada até ao fim, ultrapassando os obstáculos com os meios próprios da tua criatividade. Se te perderes na selva do mundo, faz mais um caminho... Se for um caminho bom e acessível, mais cedo ou mais tarde, muitos por lá irão passar.
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