quarta-feira, 10 de maio de 2023
T.066.Transcendência - Eliane F.C.Lima
Me passe aí a batata frita, Honey.
A moça morreu de raiva daquele inglês idiota e fora de hora.
Cara bobo! Detestava homem ridículo!
Cada vez que se dirigia a ela, lá vinha outro “Baby”.
Ela fingia que não tinha ouvido no meio da balbúrdia dos amigos, todos cheios de animação e chope.
No terceiro “Dear”, levantou-se e foi ao banheiro.
Lavando as mãos, ia ponderando: não entendia como o pessoal aguentava aquele cara.
Seria amigo de quem?
E todos falavam com ele, com consideração, bem que via.
Aquilo era um mistério.
O tal era um bobalhão, vocabulário de conquistador barato e antigo.
Quando voltou, sentou-se em outro lugar bem longe dele.
Solução perfeita.
Num momento, porém, em que voltou a olhar para aquela ponta da mesa, reparou que o rapaz estava meio ausente, olhos no ar.
Em seguida, procurou um guardanapo de papel, meio aflito, tirou uma caneta do bolso e pôs-se a escrever.
Leu para si, consertou alguma coisa e mostrou, finalmente, para a garota do lado.
Ela leu, sorriu em êxtase, jogou para ele uns olhos enormes e acenou para todos os lados, pedindo silêncio.
E conseguiu, sem o menor esforço, como se todos esperassem por aquilo.
E Vivinha – era o apelido da primeira e entediada moça –
Ouviu o poema mais milagroso e ousado e perfeito de sua vida, enquanto se levantava, sonâmbula, e ia caminhando,
Desejando uma cadeira vaga em frente ao poeta.
Fonte: http://conto-gotas.blogspot.com
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