segunda-feira, 30 de abril de 2018
Crônica.O.004.O Grito - Bruno Kampel
Penélope pulou da cama com a impaciência impondo-lhe o ritmo. A despeito da tremedeira incontrolável que dominava cada um dos músculos do seu corpo, e do receio insuportável que ocupava cada um dos seus sentidos, trotou alucinadamente até o outro lado do quarto, onde se encontrava o armário. Decidida a elucidar o grande mistério que a atormentava, posicionou-se frente ao guarda-roupa, ao mesmo tempo em que fechava os olhos, cumprindo à risca a primeira etapa do plano que traçara enquanto tratava infrutiferamente de reconquistar a calma e afundar no sono, e abriu-lhe a porta com a urgência inerente àqueles que, por razões de variada e quase sempre desconhecida origem, necessitam constatar questões de vida ou morte, assuntos inadiáveis, situações intransferíveis, ou decisões irreversíveis. Quando Penélope considerou que estava bem posicionada em relação ao espelho - o qual ocupava toda a parte interior da porta esquerda - decidiu dar o grande e temido passo, e numa lentidão que lembrava muito a letárgica sinuosidade do caracol - talvez porque na verdade o que ela realmente desejasse fosse adiar "sine die" a chegada do momento crucial - foi entreabrindo os olhos até que estes ficaram literalmente desorbitados, e então, ao focalizar a vista na imagem refletida no espelho, suas pobres e enfraquecidas pernas, contrariando todos os prognósticos médicos, conseguiram sustentar o peso da enorme aflição que a invadira, pois o recado que o espelho lhe mandava era claríssimo e confirmava que seus temores tinham fundamento, pois o pesadelo ainda continuava. Sim. O espelho, certamente em conluio com seus dramas mais profundos, devolvia-lhe como única resposta à sua presença frente a ele, tão somente a imagem bem delineada do perfil nada apolíneo de um patético grito de dor pungente, o qual, numa atitude abertamente provocativa, caçoava dos olhos febris que o seguiam, galopando pela superfície do cristal, indo e vindo, sem pressa nem rumo, emitindo essa bem conhecida e repulsiva sonoridade - dilacerante e arrítmica - que apenas os silêncios mais profundos sabem executar com mestria. Ante a constatação de que o desespero sem freio ainda era dono e senhor do seu destino, Penélope foi invadida por uma sensação de impotência que não lhe era estranha, e que, como em outras tantas e tantas vezes, tomou conta de cada canto dos seus olhos, imprimindo neles uma opacidade monocromática e assustadora, transformando-os outra vez em fiéis depositários do pânico sem fronteiras.
Sim. Penélope, cativa do pavor irracional que o grito lhe inspirava - e ainda pior, consciente de que seria a vítima e não a heroína do último capítulo da novela da sua vida - entreviu com o rabo dos olhos como a perplexidade, recém parida pelo estupor que a dominava, somava-se ao monólogo em preto-e-branco que desde o espelho o grito desafinadamente declamava.
Quase vencida, e convencida da certeza da derrota iminente, Penélope escorregou para fora de si mesma e caiu no pântano da mais profunda insanidade, enquanto a penumbra circundante começava a empapar-se com lágrimas de dor insuportável, e o grito intolerante, exigindo o protagonismo que julgava merecer, respondia sem mais delongas, solfejando um desespero nu e cru que até então escondia no fundo da cartola, começando a delirar um discurso gutural que não deixava a menor margem para dúvidas quanto ao final previsto dessa luta desigual e sem quartel, entre Penélope e seus fantasmas. As lágrimas de fel - elaboradas com a mais pura, cristalina e legítima angústia existencial - iniciaram uma corrida cega e sem freio pela escorregadia pendente vertical em que se havia transformado a sua face, e o grito infame, para não fazer por menos, cuspia desde o espelho o seu doloroso lacrimejar de vidro e raiva, enquanto a desesperança, atônita ante a cena que presenciava, oficiava a cerimônia nupcial que unia para todo o sempre a loucura e o abismo. A madrugada, que naquela hora por ali passava, fazia de conta que nada disso era com ela, espiando pela janela sem se dar por aludida. Penélope então, num último e desesperado intento de autodefesa, tratou de fechar os olhos usando as poucas forças que ainda lhe restavam, procurando com tal gesto escapar da cilada que a vida lhe havia tendido, mas para não fugir à regra que rege as circunstâncias de todas as tragédias, quando o tentou já era tarde demais, pois o grito indigno - num salto acrobático - alcançou-lhe a garganta e lá instalou-se soberano, rasgando em pedaços mil gemidos sem sentido, cujos restos sonoros macularam para sempre o silêncio asséptico do amanhecer no quarto 22 da clínica psiquiátrica. Penélope morreu gritando - uma morte totalmente afônica - e como é de praxe em todos os crimes que pretendem ser perfeitos, as impressões digitais do grito assassino esvaíram-se silenciosamente, instalando no ar o tão conhecido e habitual eco da impunidade, ao passo que o amanhecer, cumprindo fielmente o seu horário de funcionamento, espreguiçava-se despreocupadamente senconstado na janela do quarto, e a enfermeira de turno, alheia a todos os dramas que não fossem os próprios, ordenava à arrumadeira que trocasse os lençóis, na expectativa da chegada de um novo paciente.
" Quem é que nunca teve um Marcelo, um Felipe, um Ricardo, um Júlio ou um Alexandre na vida? Tudo bem, pode ser uma Júlia, uma Ana, uma Patrícia ou uma Aline... Paquerar é bom, mas chega uma hora que cansa! Cansa na hora que você percebe que ter 10 pessoas ao mesmo tempo é o mesmo que não ter nenhuma, e ter apenas uma, é o mesmo que possuir 10 ao mesmo tempo! A ""fila"" anda, a coleção de ""figurinhas"" cresce, a conta de telefone é sempre altíssima. Mas e aí? O que isso te acrescenta? Nessas horas sempre surge aquela tradicional perguntinha: Por que aquela pessoa pela qual você trocaria qualquer programa por um simples filme com pipoca abraçadinho no sofá da sala não despenca logo na sua vida??? Se o tal ""amor"" é impontual e imprevisível que se dane! Não adianta: as pessoas são impacientes! São e sempre vão ser! Tem gente que diz que não é... ""Eu não sou ansioso, as coisas acontecem quando tem que acontecer."" Mentira! Por dentro todo ser humano é igual: impaciente, sonhador, iludido... Jura de pé junto que não, mas vive sempre em busca da famosa cara metade! Pode dar o nome que quiser : amor, alma gêmea, par perfeito, a outra metade da laranja... No fim dá tudo no mesmo. Pode soar brega, cafona... Mas é a realidade. Inclusive o assunto ""amor"" é sempre cafonérrimo. Acredito que o status de cafona surgiu porque a grande maioria das pessoas nunca teve a oportunidade de viver um grande amor. Poucas pessoas experimentaram nesta vida a sensação de sonhar acordada, de dormir do lado do telefone, de ter os olhos brilhando, de desfilar com aquele sorriso de borboleta azul estampado no rosto... Não lembro se foi o ""Wando"" ou se foi o ""Reginaldo Rossi"" que disse em uma entrevista que se a Marisa Monte não tivesse optado pelo ""Amor I love you"" e que se o Caetano não tivesse dito ""Tô me sentindo muito sozinho.."" eles não venderiam mais nenhum disco. Não adianta, o público gosta e vibra com o ""brega"". Não adianta tapar o sol com a peneira. Por mais que você não admita: - Você ficou triste porque o Leonardo di Caprio morreu em Titanic"" e ficou feliz porque a Julia Roberts e o Richard Gere acabaram juntos em ""Uma Linda Mulher""... - Existe pelo menos uma música sertaneja ou um pagodinho"" que te deixe com dor de cotovelo; "
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