quinta-feira, 28 de outubro de 2021

N.062.Neste ontem-castelo - Alexei Bueno


Neste ontem-castelo…

Neste ontem-castelo, sol rememorado,
Declínio tão fundo que é um lembrar do ocaso,
Vazias de homem, num pântano raso
Afundam-se as vidas, vai a morte ao lado:
Dentes que se trincam sem dentes na morte
Pelas equipagens inúteis de guerra
Que, perdida ou ganha, o mesmo nada encerra
Tanta hora após, tão afogada a sorte.
Peitorais sem sangue, viseiras no escuro,
Nomes de heróis mortos nas tapeçarias,
Mortos duas vezes, vomitar dos dias
Que a razão de tudo soterrou num muro.
Mortos de seu nome, mortos no porquê...
Puderam morrer por terem sido um tanto.
Mendigos de então com ulcerado canto
Nem morte tiveram, que a vida os não vê.
Olhos visitantes que são calma e agora
A correr sem febre o vestido das damas,
A não-febre de hoje que cheira das camas,
A febre do amor, da peste, do ir da hora.
Pêndulos que batem, mas nem visam nada,
Não existe tempo nas pedras daqui
E tudo se empedra, e toda pedra ri
No arranhar segundos pela madrugada.
Espada que fura, mas não tem mais ponta...
Leão que devora, mas não tem mais dente...
Luva que degola, com a mão ausente...
Sábio sem mais olhos que as estrelas
conta.se hoje tudo é morto, teve raiva um dia,
Teve sangue e o sangue derramado alheio,
Coração que pulsa à carta que não veio,
Mas minha alma a tudo consegue ser fria,
Do fundo de um fosso, de espiar de estrela...
Nunca batalhei e nem vitória quero,
Nem derrota alcanço, esqueço de onde espero...
Deus nem luta dá para eu poder perdê-la.

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