sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

U.052.Urgência - Nathaly Guatura


Eis-me aqui novamente em tanta súplica perante as velas Mentindo que mentisse quando punha-me a considerar Que das belezas mais amáveis que a vida ousa me negar Tu foste (inda é), desesperadamente, a maior de todas elas.
Escrevo, assim, mais que sorumbáticas letras atemporais Das saudades que eu sentia de nossos utópicos carnavais. Mais que a desventura dos vestígios que me vieste exalar. Muito mais que o destempero deste pedaço de meu pesar.
Alerta-me de tua existência, lança-me um brado, um ruído Que reexista contigo o ser que conheceste, que já não sou Sem ciência do que outrora fui, hoje somente animal aluído Tomado do instinto, num deletério ímpeto busca-lo, eu vou!
Em tua busca, desatinei praça em praça por toda essa Minas Caindo agora, sob esse céu sem luar, ao som de coisa alguma Avistando absolutamente nada senão previsões matutinas Descanso os olhos e de repente, não mais existo, em suma.
Amanheço bicho oco. Um bicho repleto. Um bicho alucinado pela saudade.

U.051.Um Guardanapo - Nathaly Guatura


Com essa mania de Poesia
Eu te perdi no rumo da prosa
Tentei te encontrar
Na taça
Mas o vinho era distinto e
Me tomou no seu lugar

U.050.Um minuto de silêncio - Douglas Farias


Naquele minuto que pensares em mim
Em silêncio, ouça minha canção
Que eternamente soará aos seus ouvidos
Trazendo calma ao seu coração

Naquele minuto que lembrares de mim
Em silêncio, deixe uma lágrima rolar
Saberás que o passageiro é eterno
Nunca se sentirá só quando pro céu olhar

Minuto de silêncio
Silêncio...

U.049.Um beijo a mais - Douglas Farias


Faz de conta que aquele beijo valeu
E nada fale do que pensa a respeito
Não fui eu, não foi você, fomos nós
Foi o momento, oportuno momento

Inesperado, da rejeição ao sorriso
Inexplicável, pois não permitiria
Irrevessível, outro não conseguiria
Inesquecível, vivo a lhe dizer

Só penso naquele beijo
Agora muito mais lhe desejo
Mexe o coração quando te vejo
Te amar só faz machucar a mim mesmo

Só resta saber se um dia lembrará
O toque no rosto, o beijo na boca
Há uma chance de tornar real
Podemos deixar tornar real

Naquela noite você e eu
Seu sonho se juntou ao meu
Aconteceu, você não esqueceu
Mas aquele beijo foi nosso adeus

U.048.Uma louca tempestade - Ana Carolina


Eu quero uma lua plena
Eu quero sentir a noite
Eu quero olhar as luzes
Que teus olhos
Não me têm deixado ver
Agora eu vou viver...

Eu quero sair de manhã
Eu quero seguir a estrela
Eu quero sentir o vento pela pele
Um pensamento me fará
Uma louca tempestade...

Eu quero ser uma tarde gris
Quero que a chuva corra sobre o rio
O rio que por ruas corre em mim
As águas que me querem levar tão longe
Tão longe que me façam esquecer
De ti...

Eu quero partir de manhã
Eu quero seguir a estrela
Eu quero sentir o vento pela pele
Um pensamento me fará
Uma louca tempestade...

Eu quero uma lua plena
Eu quero sentir a noite
Eu quero olhar as luzes
Que teus olhos
Não me têm deixado ver
Agora eu vou viver...

Eu quero ser uma tarde gris
Quero que a chuva corra sobre o rio
O rio que por ruas corre em mim
As águas que me querem levar tão longe
Tão longe que me façam esquecer
De ti...

Tão longe que me façam esquecer
De ti...

U.047.Um amor para amar - Douglas Farias


Conhecerei seu amor, da investida de um olhar Através de um olhar, um lindo sorriso esboçaras Desse lindo sorriso fez-se um coração apaixonar Almejo esse amor, esse olhar, esse sorriso
Agora sabes que por ti possuo um grande desejo Em uma mão tenho uma perfumada orquídea a lhe dar Enquanto com a outra, seu rosto suavemente à acariciar Evitando não tirar atenção de sua doce voz ao falar
Tenho seu amor, aceite o que tenho a oferecer Terás por toda vida um coração para amar Saberás que não há do que duvidar Pra sempre um amor, pra sempre te amar

U.046.Uma vez - Douglas Farias


Como um feixe de luz, passou por mim Não teria percebido se não fosse o perfume De uma vez num dia chuvoso nos encontramos Foi uma vez, num irresistível deslumbre
Como esquecer um sorriso encantador E olhos de mel tão intensos e vibrantes De uma vez que a vi com seu guarda-chuvas Foi uma vez, conheci alguém tão interessante
Mesmo sem o que dizer, aproximei de você "Bom dia" e "que chuva!" foi o máximo que saiu De uma vez que você olhou pra mim Foi uma vez, que amor assim assentiu

U.045.Eu - Florbela Espanca


Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho,e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida ...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!

U.044.Uma canção feita de mim - Fernando Neto


A música do momento
tudo quer de mim um pouco
e, pouco a pouco
vai levando o muito que há em mim
neste som, nestas teclas, nestas notas
cordas
caminho onde deslizo
meus dedos acompanham
este som que vem daqui
o ritmo, as batidas
sentidas
do som que vem de dentro
meu coração está assim
com saudades de mim...

U.043.Um lugar que só nós conhecemos - Keane


Eu andei por uma terra desabitada
Eu conhecia o caminho como a palma da minha mão
Eu senti a terra sob meus pés
Eu sentei ao lado do rio e ele me completou

Coisa simples, para onde você foi?
Eu estou ficando velho e preciso de algo em que confiar
Então me diga quando você vai me deixar entrar
Eu estou ficando cansado e preciso de algum lugar para começar

Eu encontrei por acaso uma árvore caída
Eu senti seus ramos olhando para mim
Esse é o lugar, onde costumávamos nos amar?
Esse é o lugar com o qual eu tenho sonhado?

E se você tiver um minuto por que nós não vamos
Falar sobre isso num lugar que só nós conhecemos?
Isso poderia ser o final de tudo
Então por que nós não vamos
Para algum lugar que só nós conhecemos?
Algum lugar que só nós conhecemos

Então se você tiver um minuto, por que nós não vamos
Falar sobre isso num lugar que só nós conhecemos?
Isso poderia ser o final de tudo
Então porque nós não vamos
Então porque nós não vamos

Isso poderia ser o final de tudo
Então porque nós não vamos
Para algum lugar que só nós conhecemos?
Algum lugar que só nós conhecemos?
Algum lugar que só nós conhecemos?
Richard Hughes, Tom Chaplin e Tim Rice-Oxley

U.038.Uma peça em quatro anos - Pastorelli


Primeiro ato.

Reluzente nos trazes finos, com orgulho ostentava im­ponência toda empertigada, ereta, sentada no banco traseiro do carro. Sua posi­ção social dizia para não perder a pose, manter a ostentação sem se desleixar.
Amendoados os olhos olhavam pela pequena ja­nela. Não prestava muita atenção. Conhecia por onde passavam. Fazia sempre esse percurso, quase todo dia. O semblante passivo não dei­xava os músculos se mexerem.
Não se preocupava James competente, dirigia com mão firme sem sair do itine­rário. Confiante, lentamente James virou à esquerda, subindo devagar a avenida dois. No meio do quarteirão, di­minui a marcha, acendeu o pisca-pisca e encostou o carro em frente à loja. James puxou o freio de mão, desligou o motor, desceu passando pela frente do veículo e abriu a porta para a patroa que esperava vendo os movimentos do chofer.
James abriu a porta e respeitoso segurando a maçaneta, ajudou a pa­troa a descer. Devagar, apreciando cada gesto, se excitava saboreando a sensação que causava. A fim de aumentar o impacto, parou no meio da calçada olhando para os lados, e num mo­vimento provocante, eró­tico, com a mão livre, a outra segurava a bolsa, passou a mão no ves­tido justo tentando alisar o amassado por ter es­tado tanto tempo sen­tada.
Ao mudar o passo levando a mão procurando algo para se equili­brar, caiu. Tinha quebrado a perna direita, o palito se partira. Gina olhou em volta. Ah! Aqui está, achei, esse servira, disse trocando o palito que­brado pelo novo que fazia de perna para a boneca. Pronto, continuemos.
James sacudiu a cabeça demonstrando descon­tentamento. A pa­troa mancava! A perna direita estava um pouco maior, diferença pequena, porém sem perder a pose, mancando ela entrou na loja. Encos­tado no carro, James observava. Lamentava a patroa não merecia isso, que decepção, pensou. Em fim o que poderia fazer além de servir, nada mais.
Nisso a patroa saia da loja acompanhada por um funcionário sobrecarregado de pacotes. Prestativo James pegou os em­brulhos e colocou no porta mala, depois abriu a porta dizendo:
- Sinto muito senhora.
- Obrigada James, vamos embora estou cansada.
- Des­culpe senhora se me permite.
- O que?
- Desculpe senhora não vai ser possível não agora.
- Porque James?
- A senhora não ouve?
- Ouvir o que, James?
- Ouça es­tão chamando à senhora.
- O que?
Ergueu a cabeça, re­almente, ouviu seu nome sendo chamado.
- Ah! Justo agora!
Colocou a boneca manqui­tola no chão.
- James, por favor, não saía daí, vou ver o que mamãe quer e já volto.

Segundo ato.

Na sala estavam três mulheres.
A mãe, a tia, cunhada da sua mãe, e a vó.
- Bença vó, bença tia.
Cumprimentou educadamente.
- Deus te abençoe, responderam as duas quase ao mesmo tempo.
- Ah! Gina venha aqui, disse a mãe. Por favor, vá até a casa da tia buscar carvão em brasa para a vó fazer defumação.
- Fale para sua prima escolher os que estiverem bem vermelhos, disse a tia.
- Cuidado para não se queimar, falou a vó.
-Olhe bem antes de atravessar a rua, recomendou a mãe.
Ao abrir a porta, Gina sentiu o sol. Tapando os olhos com a mão, olhou o céu claro. As nuvens brancas estavam bonitas, gostava de ficar deitado no quintal vendo as formas que as nuvens cria­vam.
Bem lá vou eu, pen­sou, em mais uma missão. Pena não ter trazido James para me fazer companhia.

Terceiro ato

Ao encostar a xícara nos lábios, começava a se preocupar.
- A Gina está demorando, disse a mãe.
- Não se preocupe logo ela estará de volta, falou a vó.
- Daqui a pouco ela chega, falou a cunhada.
Nisso ouviram a porta abrir e fechar.
- Ela chegou, disse a mãe se levantando.
Instantes depois estava a frente delas a menina, pálida, tremendo, chorando. Assustadas as três mulheres ajoelharam ao redor de Gina.
- O que foi, disse a mãe.
O que aconteceu, falou a vó.
- Você se machucou, perguntou a tia.
Gina não conseguia falar. Deram um copo d’ água com açúcar. A mãe colocou a menina no colo. Com muito custo conseguiu contar.
A prima pegara umas quatro brasas e enrolara no jor­nal dizendo:
- Olha, se o jornal começar a queimar, volte aqui que te darei mais jornal.
E quando ela atravessava o Jardim da Boa Morte, o jornal pegou fogo. Assustada jogou longe as brasas e o jornal incendiado, e viera cor­rendo. As três mulheres olharam para Gina, uma para a outra, e caíram na gar­galhada.
A menina coitada chorava. Assim Gina ganhou por mui­tos anos o apelido de Maria da Brasa, tudo por causa da prima.

Quarto ato.

Gina fechou o caderno.
Sorriu vendo sua imagem no espelho do quarto. Então o irmão com a mania besta de escritor, escrevera esse conto sobre o que lhe acontecera há.... Quanto tempo? Uns quarenta anos mais ou menos, ela nem se lembrava mais.
Me­xendo nas tranquei­ras descobrira o caderno. Na época dera uma bronca no irmão. Era o seu segredo sendo revelado. Ficou quase uns dois me­ses sem falar com ele. Também quem mandou escrever. Tudo porque, os filhos, os netos, as noras, até o marido tiraram um sarro da cara dela avivando o esquecido apelido.
Agora sentia que fora injusta com o irmão. Essa ma­nia besta de escrever! Nisso ouviu vozes. Chamavam por ela. Pegou o caderno e desceu. Eram os netos. Nossa estavam grandes!
- Olá, vó? Onde estão os velhos, perguntou o mais moço.
- Foram na casa do seu pai, respondeu Gina.
- Vamos lá então pessoal.
Quando iam saindo a neta mais velha se voltou perguntando,
- Vó a senhora estava chorando?
- Não, respondeu rápida escondendo o caderno. Vá, vá com os outros, disse empurrando a neta porta fora.
Assim que o silêncio voltou a reinar, desceu até a garagem. Rasgou folha por folha, riscou um fósforo e queimou o caderno.
Estou queimando o passado, pensou. Não foi ele que disse: temos que enterrar o passado. Depois que o último pedaço tinha sido queimado, saiu fechando a porta.

U.042.Uma canção para voce - Douglas Farias


Antes não havia canção para compor
Hoje seu sorriso me completou
As palavras que me fugiam o pensamento
Sua presença me livrou do tormento

Uma poema pra te homenagear
Lindas palavras à declarar
Com amor versos escrevi
À mulher que me faz o mais feliz

É todo seu meu coração
É sua essa doce canção
De todo meu coração queria lhe dizer
O quanto é grande meu amor por você

U.041.Um novo dia - Eliane F.C.Lima


Com os olhos ainda fechados – tentativa de não acordar de todo –, quis se espreguiçar longamente... mas, em vez de sentir os músculos se estirando, nada sentiu. Ao mesmo tempo, havia uma sensação vaga, alguma coisa que devia lembrar. Tornou a tentar alongar os braços e pernas, só para testar, mas ainda agora não conseguia aquela sensação gostosa de todas as manhãs. Mesmo contra a vontade, começou a arriscar a abrir os olhos. Muito devagar, era o truque que tinha desenvolvido para entrar aos poucos em contato com a realidade. Realidade, porém, era uma palavra que não parecia calhar com a situação. Tentando abrir os olhos, pálpebras pesadas ainda, não viu a luz da janela. Então era isso, vai ver que não tinha amanhecido, nem madrugada fosse. O cérebro se recusava a engrenar fora do horário. Se não via, queria ouvir o que se passava em volta, pois havia algum som, havia. Um rumor vago, parecia sussurro. Era um som conhecido, que não conseguia identificar exatamente. Choro? Era choro? Um lamentoso choro de sofrimento, que estranho! Alguém estava chorando. Um sonho, com certeza. Aquela impossibilidade de se mexer, de abrir os olhos, de ouvir com clareza. Em sonho era sempre assim. Na verdade, começou a sentir um leve sobressalto. Mais do que sonho, pesadelo. Mas havia um cheiro. Contínuo, envolvente. Entrando pelas narinas. Um perfume, quem sabe. De flor. Meio nauseante. O sobressalto começou a se transformar em pânico. Havia um fato para ser lembrado. Precisava se lembrar do que tinha de ser lembrado. Era como se houvesse uma urgência naquilo. Talvez fosse a chave para acordar. De repente, saindo das profundezas do inconsciente, a lembrança veio. Avassaladora. Tremendo da cabeça aos pés, todos os seus sentidos se conectaram. E, retesada cada parte de seu ser, levitou acima de todas as flores em que estava mergulhado, de todas as pessoas taciturnas, que o olhavam, lamentosamente, e partiu pela janela, finalmente, acordado.
Fonte: http://conto-gotas.blogspot.com

U.040.Um dia Descobrimos - Mário Quintana


...Um dia descobrimos que beijar uma pessoa para esquecer outra, é bobagem.Você não só não esquece a outra pessoa como pensa muito mais nela... Um dia nós percebemos que as mulheres têm instinto "caçador" e fazem qualquer homem sofrer ... Um dia descobrimos que se apaixonar é inevitável... Um dia percebemos que as melhores provas de amor são as mais simples... Um dia percebemos que o comum não nos atrai...Um dia saberemos que ser classificado como "bonzinho" não é bom... Um dia perceberemos que a pessoa que nunca te liga é a que mais pensa em você... Um dia saberemos a importância da frase: "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas..." Um dia percebemos que somos muito importante para alguém, mas não damos valor a isso... Um dia percebemos como aquele amigo faz falta, mas ai já é tarde demais... Enfim... Um dia descobrimos que apesar de viver quase um século esse tempo todo não é suficiente para realizarmos todos os nossos sonhos, para beijarmos todas as bocas que nos atraem, para dizer o que tem de ser dito... O jeito é: ou nos conformamos com a falta de algumas coisas na nossa vida ou lutamos para realizar todas as nossas loucuras...Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação.

U.039.Um plano… Um filme...Uma vingança - Patorelli


Descia a escada quando ela chegou.

A esposa nada dissera que ela vinha. Não tinha a prática de receber visitas. Por isso estranhou.

Constatou a exuberância feminina de Silvana apagando a feminilidade da esposa. Tendo um sorriso largo, dentes brancos, impunha um não sei o que de atrativo. O rosto oval modulado por uma disciplina estética da beleza, reforçado pelos olhos amendoados, era ressaltado pelos cacheados cabelos sobre os estreitos ombros. O busto de seios rijos, quadril no padrão normal aguçava qualquer masculinidade.

- Se eu soubesse que você vinha teria colocado uma camiseta, disse Cláudio cumprimentando.

- Não esquenta! Não ligo para isso, respondeu Silvana.

- Cláudio gosta de ficar a vontade depois do banho, disse Rúbia como explicação.

- Mesmo assim, vou colocar uma camiseta, disse Cláudio subindo a escada.

Revirou as gavetas uma por uma procurando a mais nova, bonita, a que ganhara de aniversário. Olhou-se no estreito espelho da porta do guarda-roupa. Na fria imagem refletida sentiu-se satisfeito.

No momento que o pé direito começava a tocar o primeiro degrau, estarrecido interrompeu o movimento. O que seus olhos viam a mente não queria registrar como verdade o que via. Não pode ser? O que é isso? Retrocedeu o passo suspenso. Rúbia beijava Silvana num escandaloso beijo. Cláudio retrocedeu até se encostar a parede. As pernas tremiam. Sentiu o frio intenso congelar os sentimentos. Uma pedrada não seria tão forte como a dor arrebentando o peito.

Viu seu reflexo no estreito espelho. Com raiva tirou a camiseta bonita jogando longe. Vestiu outra qualquer. Precisava descer. Respirou fundo. Saiu do quarto batendo a porta.

Procurou se concentrar na naturalidade dos gestos ao descer a escada como se nada tivesse acontecido. Enquanto conversavam, prestou atenção nas entrelinhas das palavras. Nos olhares de uma para outra. Nos gestos... Não percebeu nada que pudesse denunciá-las.

Remoendo o cérebro, perguntou a si mesmo o que deveria fazer. No momento não devo fazer nada. Talvez, mais tarde possa pedir uma explicação à Rúbia. A conversa não estava de nada interessando a ele. Subiu para terminar o trabalho gráfico que vinha fazendo.

Fixou no pedestal a filmadora e colocou numa posição privilegiada para que as duas não perceberem. Ligou a filmadora e do micro foi manuseando a câmara. Virava para a direita, para a esquerda, acionava o zoom, deslocava, congelava a imagem, filmava as duas nos abraços e beijos.

Ao mesmo tempo maquinava uma pequena vingança. Durante aproximadamente, uns trinta minutos de gravação, achou suficiente. Retirou a filmadora do pedestal e passou a trabalhar as imagens no computador. Eram cenas explicitas fortes, ousadas em que as duas se extravasaram nas carícias. Ao puxar mais para perto uma cena, em que sobressaia a feição de Rúbia, pode notar a satisfação, o prazer estampado que nunca percebera.

Quando terminou o que tinha de ser feito, passou para uma fita, desligou o micro, guardou a filmadora e fechou o pequeno escritório.

Eram mais de três horas da madrugada. Não vira Silvana sair e muito menos quando Rúbia foi deitar. Ainda bem. No quarto, com maior cuidado para não acordar a esposa, pegou umas roupas, enfiou na mochila e saiu. Deixou a porta do quarto aberta. Na sala ligou a televisão e colocou a fita no vídeo. Programou tudo para ser ligado automaticamente, dali a duas horas e saiu indo para um hotel.


Estava terminando uma cena para um comercial de cuecas, quando ouviu que alguém entrava. Minutos depois, Sandro apareceu.

- Olá! Como está?

- Estou bem, disse Cláudio cumprimentando o amigo com um
beijo.

- Já está definitivo aqui?

- Sim.

- Então deu tudo certo?

- Veja você mesmo.

Sandro leu :
_____________________________________________________________
De : Rúbia

Para : Cláudio

Enviada em : 16 de junho de ...

Assunto : Perdão

Cláudio me perdoe se te magoei.
Você saiu repentinamente.
Ia te explicar tudo.
Mas foi melhor assim.
A fita que você deixou queimei.
Estou em Roma feliz como a muito deveria estar.
Silvana e eu vamos montar um apartamento.

Beijos e felicidades
Rúbia

- Quer dizer que deu tudo certo?

- Melhor que a encomenda.

- Eu sabia que Silvana não iria falhar. Não esperava que fossem se apaixonarem.

- Como você conseguiu convencer ela?

- Com uma pequena aposta.

- O plano era apenas para Silvana se envolver com minha esposa, para que eu tivesse um pretexto e acabar com o casamento.

- Não estou entendendo uma coisa. Ela fala em fita! Que fita é essa?

- Ah! Fita! Não estava mesmo no plano. Não desmascarei as duas no ato. Filmei toda a relação amorosa das duas, e no micro trabalhei as imagens. O que deu um filme de uma hora mais ou menos. Fiz duas cópias, deixei uma no vídeo pronto para ser ligado automaticamente, e a outra copia inscrevi no festival Mix.

- Puxa! Pena eu não estar presente para ver a cara dela.

- Mas o melhor vem agora.

- O que?

- Ganhei o prêmio de revelação do festival!

- Ganhou?!

- Vinte mil reais!

- Caramba!!

- E vendi os direitos do filme para uma distribuidora, que nesse momento creio já espalhou para o Brasil todo.

- Nesse quase dois meses que estive fora, você trabalhou!

- Fez boas fotos?

- Fiz. Cada uma... Mas não vamos falar de mim não. Vamos tomar um banho, abrir umas cervejas, e ver esse filme premiado.

- Sinto muito. Só se for alugado. No contrato de venda tinha uma clausula no qual rezava que eu não podia ter nenhuma cópia.

-Que chato!!

- Chato nada. Vamos tomar um bom banho, sair, dançar, festejar sua volta, a minha liberdade e começar a gastar esses vinte mil reais.

-Isso mesmo. Vamos lá então.

U.036.Um "dedo-de-prosa" - Lucelena Maia


Agrada-me dizer do homem do campo
esse simplório contador de "causo"
sob o sol ou ante a um pirilampo,
arrebata de quem o ouve, aplauso...

Observá-lo e aos seus sonhos deitados
na modesta casa de pau-a-pique,
fumando cigarro - fumo picado -
soprando a fumaça para o alambique...

Com palha nos lábios, face sorrindo
ele, que tem vida quase banal
agradece a Deus, pelo dia findo.
Eu! Pela simplicidade rural

Elevadas as mãos com fugacidade
num "dedo-de-prosa" muito tranquilo
carrega na voz arrastada idade
e nos "causos" que conta, rico estilo

Seus olhos, por vezes, pescam do céu
as estrelas mais brilhantes que vêem
direcionando-as com alma fiél
para os amigos que, como ele, crêem...

"...A vida, como presente divino,
e porque é, nós devemos respeitá-la
e ao próximo, também ao destino".
Assim ele encerra sua mansa fala.

U.037.Um pouco antes da primavera - Rosa Pena


Nas semanas que antecedem a primavera começo a criar novas expectativas. Vivo movida por elas. Em cada estação tenho uma. Nesse inverno tive a sensação do pré-catártico, do pré-apocalíptico e não é que os ventos tentaram me derrubar?


Perder amigos, operar e ser obrigada a um descanso obrigatório (descansar do que se ama fazer!?) é trágico demais para o contorno do meu sorriso.

Devo confessar que tive um verão de mediano a fraco, mas um outono que merece o Oscar. O casamento de minha filha (lindo de viver) e uma viagem maravilhosa (fico bem sebosa pra dizer que rever a Europa é sempre show).

Se eu acreditasse em olho gordo mandava um monte de gente colocar balão gástrico nas retinas, pois a surra que a bendita vida aprontou para mim depois desses momentos mágicos do maravilhoso mundo da Rosa, parece coisa feita! Se foi macumba, foi realizada pelos mesmos que trabalharam contra o Romário. Quem merece é o senado que ganha sem bater um bolão. Quem merece é o Lula que me fez acreditar que o Bush, Arafat e outros mais eram najas criadas. São minhocas imbecis perto dele.

Volto para as vésperas da primavera onde as flores se preparam para mais um prêt-à-porter. O fundo musical do desfile é o piano do Tom Jobim. Ele é um gênio eterno, sem virtuose no sentido de técnica programada, ele foi e sempre será virtuoso no improviso, no pensamento que vai para as mãos, nas idéias, nos silêncios sugeridos, na rouquidão da voz, no jeito tesão Leblon que já nasceu com ele, apesar dele ter nascido na Tijuca. É um estado de espírito. Costumo dizer que o homem que sabe o que é bom anda desde neném com camiseta hering branca. Ai Jesus...me abana!

O que espero dessa primavera ?

Os beijos na boca que só dei em sonhos, à volta da paz no meu sorriso, o sono sem tarja de cor alguma e porque sou má, desejo também para quem torce contra a felicidade em geral, um sobrepeso de vinte quilos. Vão tomar chás verdes, brancos, amarelos, cor da bandeira do Brasil. Minha praga costuma ser boa de pegar. Mas não espero só isso depois desse inverno com "f". Espero mais, bem mais. Anseio pelo sol sem intenção de câncer e o mar regido por Tom.

U.035.Uma noite de paz - Marcão e Bene Maldonado


Você já esqueceu do aniversário de quem você ama.
Já esqueceu o nome de alguém que te ama.
Mas chega o fim do ano e é tudo igual,
Eu acho que vocês acham que eu sou débil-mental!
São mais de 300 dias debaixo da opressão
Medo da guerra, da bala perdida, medo do medo da solidão,
Eu vejo os shoppings lotados, ruas lotadas,
Avenidas decoradas por corações vazios...

Feliz Natal! Pra criança deixada na rua...
Noite Feliz! Praquele que não tem o que comer!
Feliz Natal! Pro pai desempregado...
Noite sem paz! Praquele que a morte veio ver!
Uma noite de paz! Uma noite...

Estava desconfortável, escuro e frio...
O cheiro dos animais invadia o curral
Onde a virgem Maria trouxe ao mundo
O Príncipe da Paz, o único capaz
De transformar o caos em harmonia,
A tempestade em calmaria,
Corações sujos como aquela estrebaria
Em um lindo shopping center decorado pro Natal...

Feliz Natal! O natal que muita gente esqueceu!
Noite Feliz! Pra quem ainda não veio pra festa!
Feliz Natal! O mundo é quem ganhou o presente!
Noite sem paz!
Pra quem esqueceu daquele que nunca te esqueceu!

Feliz Natal! Deixe-o nascer em seu coração!
Noite Feliz! O passado fica pra trás!
Feliz Natal! Você é o presente de Deus!
Noite de paz! A morte morreu de medo ao ver Jesus nascer!
Uma noite de paz! Muito mais que uma noite de paz!

U.034.Um meio ou uma desculpa - Roberto Shinyashiki


Não conheço ninguém que conseguiu realizar seu sonho, sem sacrificar feriados e domingos pelo menos uma centena de vezes, da mesma forma, se você quiser construir uma relação amiga com seus filhos, terá que se dedicar a isso, superar o cansaço, arrumar tempo para ficar com eles, deixar de lado o orgulho e o comodismo. Se quiser um casamento gratificante, terá que investir tempo, energia e sentimentos nesse objetivo.

O sucesso é construído à noite! Durante o dia você faz o que todos fazem. Mas, para obter um resultado diferente da maioria, você tem que ser especial. Se fizer igual a todo mundo, obterá os mesmos resultados, não se compare à maioria, pois infelizmente ela não é modelo de sucesso, se você quiser atingir uma meta especial, terá que estudar no horário em que os outros estão tomando chope com batatas fritas. Terá de planejar, enquanto os outros permanecem à frente da televisão. Terá de trabalhar enquanto os outros tomam sol à beira da piscina.

A realização de um sonho depende de dedicação, há muita gente que espera que o sonho se realize por mágica, mas toda mágica é ilusão, e a ilusão não tira ninguém de onde esta, em verdade a ilusão é combustível dos perdedores pois,

"Quem quer fazer alguma coisa, encontra um meio. Quem não quer fazer nada, encontra uma desculpa."

U.033.Um amigo - Douglas Farias


Palavras o vento leva
Gestos o tempo apaga
Atitudes são esquecidas
O vazio é deixado.
Mas existe aquele
Que preenche
E não deixa ser levado.
Não permite ser apagado
Nem chance de ser esquecido
Torna tudo mais fácil.
Um amigo
Um verdadeiro amigo
Preenche esse vazio