terça-feira, 24 de dezembro de 2024

O.135.O tempo - Eliane F.C.Lima


Colecionava páginas de calendário.
Ia enfiando na gaveta para guardar os acontecimentos.
Um dia, sem mais nem menos, colocou-as lado a lado sobre a mesa.
Olhava para elas. Estava ali o passado. Ano a ano.
Reconhecia algumas datas. O aniversário, a morte da tia.
Porém, por mais que olhasse, não ouvia suas vozes.
Eram páginas mudas. Mortas.
Era como se o tempo que escorreu estivesse trancado em um cofre.
Inacessível.
Então fechou os olhos e lembrou o dia da morte da tia: o telefonema, o táxi, as pessoas, a tarde toda, o enterro.
Agora o passado falava, tinha som, tinha cor, movimento.
O passado revivia no presente.
Viu que apenas o presente existia.
De olhos fechados, ainda, pensou no futuro.
Era mais difícil ainda, nenhuma imagem para ajudar.
Grande esforço de concentração encenar o futuro.
Que era isso: acontecia como representação de teatro, pura ficção.
Enorme criatividade, sua mente era um talentoso dramaturgo.
Mas nenhuma certeza.
Abriu os olhos, o presente era momentâneo e certo: sobre a mesa muitas páginas de calendário.
Todas mudas.
Fonte: http://conto-gotas.blogspot.com

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